segunda-feira, 20 de junho de 2011

Motivação


Provavelmente você já ouviu ou viu aquelas frases bonitas de comercial, de músicas motivadoras, aquelas que dizem "nunca desista", "você é capaz de tudo!".
Lembro-me que antes dos acontecimentos que agora me prendem na cama ou na cadeira de rodas, eu não prestava muita atenção nessas frases.
Teve um tempo que eu até desacreditava delas, eu pensava "Certamente quem diz isso consegue ir atrás, andando, correndo, das coisas que quer."
Eu via na internet aqueles camaradas que se ferraram legal na vida, nasceram sem membros ou com alguma síndrome e mesmo assim seguem uma vida normal, que a grosso modo é uma vida espetacular, pois a normalidade da vida é oposta as dificuldades que ela mesmo impõe para ser normal.
Mas mesmo sem motivação e muito frustrado na vida, eu não desistia das fisioterapias e de todos os exercícios. Sou adulto, sempre foi compreensível ver os meus pais saírem de perto de mim para falarem de contas. Eu tenho noção que todos os meus tratamentos envolvem bastante dinheiro... dinheiro que não dispomos.
Meu pai, aposentado, continua trabalhando e meu irmão mais novo trabalha, ajudando muito não gastando nada dos meus pais. Minha mãe anda para lá e para cá comigo atrás dos tratamentos que preciso e quando necessário, vai em busca dos benefícios que minha atual condição exige em meio a sociedade.
Se um dia lhe disserem que são as dificuldades que vão nos tornando mais sensíveis, pode acreditar.
Fui me sentindo mal ao ver todo mundo ao meu redor batalhando por mim e eu isolado na minha tristeza.
O principal beneficiado será eu, logo eu tenho que ter forças, eu tenho que criá-las quando elas estivarem sumindo.
Percebi que agora eu sou o responsável por minha melhora, que as tratamentos sãos ferramentas essenciais para minha melhora, no entanto eu que tenho que batalhar!
E agora eu afirmo: Se você não lutar provavelmente não perderá, mas certamente nunca vencerá!

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Sarah Kubitschek

Já faz algum tempo que estou em casa, no meu quarto, vendo muitas pessoas vindo me visitar. Entre orações e pedidos de melhoras, os olhares dos meus familiares, amigos, vizinhos e colegas se alternam entre esperança, medo, pena e espanto.
Meus pais cuidam de mim, fazem coisas que havia deixado de fazer há muito tempo, como me dar comida, por exemplo.
Pesquisamos muito por algum tratamento e com muita persistência e sorte consegui uma vaga no Hospital de Referência em Reabilitação de lesão medular Sarah Kubitschek, em Brasília.
A ansiedade tomou conta de todos que estavam em minha volta, no entanto me restringirei a descrever a minha.
Sempre quis viajar de avião, mas nunca imaginei em tais condições, para tais fins.
Nenhuma pessoa, nenhuma família, programa sua vida e seu orçamento com uma finalidade dizendo "fundo catástrofe", ou seja, não foi fácil conseguir dinheiro de última hora para comprar as passagens e pagar a hospedagem da minha mãe que me acompanhou nesse tratamento.
A família novamente ajudou, compreendeu e se uniu.
Meu pai levou a mim e minha mãe ao aeroporto, meu irmão também foi.
Recebi beijos e abraços dos dois, enquanto minha mãe estava atrás da cadeira de rodas para me empurrar.
Olhei fixamente para o meu irmão. Ele tinha 15 anos, estava na fase de querer usar algumas roupas minhas para sair, mas elas ainda ficavam grandes.
Ele me falou para sarar logo, que tudo iria dar certo, mas eu senti um pingo de tristeza em sua voz e decidi que não o deixaria mais triste... eu iria vencer para fazê-lo sorrir.
Entramos no avião... que sensação incrível! Todo mundo ficou pequeno lá de cima, parecia uma paisagem panorâmica do jogo de computador chamado Sim City.
Aterrissagem tensa, impacto forte, treme tudo!
Agora estou em Brasília. Um novo mundo para mim. Darei então início ao meu caro e árduo tratamento para que eu volte a viver no meu velho mundo, aquele que eu jogava futebol de rua com meus amigos... ia para a faculdade... enfim, não preocupava as pessoas!

sexta-feira, 18 de março de 2011

Relato paterno


Hoje foi um dia abençoado. Depois de oito longos dias meu filho abriu os olhos, saiu do coma profundo.
Lembro-me como se fosse ontem o que aconteceu já há algum tempo. O telefone tocando de madrugada, a voz do outro lado dizendo "Sofremos um acidente, o Dan não está muito bem". Mais do que depressa peguei meu carro e fomos eu e minha esposa até o hospital municipal de Pedreira (local do acidente). Os médicos nos disseram que o Danilo havia se machucado muito, a orelha cortou e ele estava desacordado. Entramos em choque.
Um dos guardas do hospital me entregou alguns retalhos de roupa e disse que eram do Dan e que cortaram para facilitar o atendimento. As calças rasgadas e tingidas de vermelho. A jaqueta do seu curso com o emblema sujo de sangue. Chorei nas roupas, confesso sem vergonha nenhuma que eu chorei.
Volto a atenção ao meu filho, ele está de olhos abertos e resmungando, ainda sob forte sedação e com muita dificuldade para falar. Ele deu um grunido, não consegui entender se era de dor ou de qualquer outra coisa.
Me senti pequeno, minúsculo, impotente diante ao momento. Eu sou pai, me sinto na obrigação de amparar meu filho, mas o que eu era agora? Um fraco diante toda essa situação?
Meu filho tenta se mexer e olha desesperado para a mãe e para mim, buscando pelo olhar alguma ajuda, alguma explicação.
Tomei fôlego e disse:
-Filho, as coisas mudaram agora, mas seremos fortes, nós vamos sair dessa juntos.

Dia trágico

Estávamos preparados para mais uma noite de festa. Como é bom fazer faculdade! Não só por saber que está, pela primeira vez, estudando algo que realmente gosta, mas também pelas festas, pelos amigos, pelas belas garotas.
Tínhamos um grupo de 5 amigos de cursos diferentes, mas do mesmo bairro que íamos juntos para a faculdade. Alternávamos os dias de cada um usar o carro próprio na intenção de diminuir os gastos com os estudos, já que os valores mensais de um curso em uma universidade particular são muito altos.
-Tá pronto, Dan?
-Nasci pronto, meu querido!
Desta vez os amigos eram outros. Estava com 2 amigos de sala do curso de Engenharia Ambiental e a saída da faculdade não tinha como destino nossas casas, mas sim uma festa! Que bom é ser universitário!
Lá chegamos e logo percebi o porque de eu ter gastado quarenta reais para entrar na festa. Lá se via alegria, garotas, meus amigos, as cervejas trincando de gelada, a música que convidava para uma dança...
Para esquentar o espírito nada melhor que uma cerveja gelada. De gole em gole tudo vai ficando mais belo, parece que as pessoas começam a gostar mais de você, as meninas começam a piscar, a vida fica mais simples de ser vivida.
Acompanhei o som que tocava e os amigos que bebiam.
Já era 4:05 am, estava tarde, era necessário ir embora. Na hora eu até pensei na bronca que minha mãe daria por eu ter saído de madrugada... passar com sono pela rodovia... mas eu sou adulto, já sei me virar.
-Deixa eu ir no banco de trás que eu tô quebrado, galera. - falei para os meus amigos que consentiram.
Eu estava com sono e resolvi dormir. Como estava no banco de trás ficou mais fácil para eu me acomodar melhor. Tentei apoiar a cabeça no vidro do carro e o cinto me impediu. Então tirei o cinto, afinal no banco de trás os riscos são menores...
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Não sei ao certo que dia é hoje. Estou meio atordoado com o clarão que as luzes florescente fizeram quando retomei a real consciência e abri os olhos. Afinal, foram 4 meses que variaram entre coma, complicações hospitalares e doses altíssimas de medicamentos que me deixavam completamente dopado.
Perguntei o porque de eu estar ali e me disseram aos prantos que meu amigo dormiu ao volante e bateu de lateral em um caminhão. Meus dois amigos estavam lá, me olhando.
Meu amigo que dirigia o carro veio ao meu encontro e chorando pedia milhares de desculpas. Eu, com dificuldade devido a traqueostomia necessária para minha respiração, tentei falar para ele relaxar e fui erguer a mão para cumprimentá-lo. Foi então que entrei em choque. Minha mão não se levantou, meus dedos não se mexeram, meu braço sequer fez algum movimento. Tentei me sentar e não senti as pernas. Abri a boca para falar algo e olhei para minha mãe, que chorava como todos que me olhavam em volta da cama.
-Danilo, meu filho, você está machucado.
Não era simplesmente machucado, eu estava tetraplégico.